A SURPRESA DE MARIETA
Marieta abanou despedidas sorridentes para o marido que já ia longe mas virava-se inúmeras vezes, como só os exageradamente apaixonados fazem. Ao mesmo tempo, não resistia olhar de soslaio a janela entreaberta do vizinho. Via Suzinando agachado, piscando maroto, jogando beijinhos maliciosos. Imaginava a diversão que a tarde recém inaugurada preparava para ambos, quando Alfredo desapareceu na esquina. Antes que ela se mexesse, Suzinando apareceu no portão, abraçado com Anita. Partiu em seguida e Anita jogou beijos infinitos enquanto Suzinando, tal qual Alfredo, se voltava a cada dez passos, abanando adeuses imensos. Não resistiu um olhar rápido para Marieta, fazendo respeitosa reverência. Anita se virou e sorriu para a generosa e encantadora vizinha. Depois de rápida conversa entre as duas, Marieta correu para os fundos, embrenhando-se através de pereiras e mimoseiras, farfalhando através das capoeiras altas, até atingir os limites do quintal. A brisa morna soprava os galhos que em resposta entoaram músicas incompreensíveis, fazendo o pensamento de Marieta vagar alhures e seu corpo sentir calafrios pela iminência dos prazeres proibidos que, pé ante pé, se avizinhavam a cada minuto. O ar morno e o vestidinho leve aguçavam apetites proibidos. Olhos fechados e mãos percorrendo o corpo ansiavam pelos acontecimentos. Espiava para fixar o muro baixo revestido de trepadeiras vistosas. Por ali, dentro em breve, Suzinando chegaria às escondidas, enlouquecido de amor como sempre, pulando o muro como um moleque, para atirar-se em seus braços. Remorsos avançavam por dentro das cavernas protegidas da antiga “filha de Maria”. Imaginava os terrores do inferno, menores que a reação de Anita se descobrisse um dia, o pecado mortal de Suzinando. Menores ainda que as sensações de prazer imenso, indizível, incompreensível, irresistível. A brisa paralisou sua dança. As folhas se imobilizaram. Um silêncio profundo, intrigante e absoluto abarrotou os ouvidos. Agradável e hipnótico, induziu Marieta a singrar pelas fendas da imaginação erótica. Subitamente, rompe-se aquele silêncio extemporâneo. O barulho de folhas e galhos amassados se agiganta, mas Suzinando não aparece. O barulho não é por perto, é mais longe um pouco, do outro lado do muro. Marieta se esgueira sorrateira como gata ladina. O barulho continua. Há sussurros, há gemidos. Ela sobe em troncos mal cortados. Com dificuldade, apóia suas delicadas mãos na quina superior do muro e ergue o corpo. Sua cabeça alcança o topo e seus olhos se derramam sobre o quintal de Anita. Ela vê os movimentos que causam o barulho. Consegue erguer-se mais, jogando o braço para o outro lado e apoiando o cotovelo, mas algum espinho ferino a surpreende. Grita incontinenti e por entre as folhas surge, intempestiva e ofegante, a cara de Alfredo, enquanto Anita, desvestida e pudica, corre desesperada para dentro de casa.
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